Quem cuida, também precisa de cuidados
Todos os dias, milhares de profissionais de saúde dão o melhor de si para manter o Serviço Nacional de Saúde a funcionar. São médicos, enfermeiros, auxiliares, técnicos e administrativos que, muitas vezes, trabalham para lá do que é humanamente aceitável. Fazem-no por sentido de missão, mas também por falta de alternativas: os hospitais estão à beira da rutura e os recursos humanos são cada vez mais escassos.
A escassez de profissionais nos serviços hospitalares não é uma novidade, mas está a tornar-se insustentável. Há urgências encerradas por falta de médicos, turnos que se prolongam por horas intermináveis, equipas exaustas a acumular funções, utentes que esperam horas por atendimento e decisões clínicas a serem tomadas sob pressão constante. Isto não é apenas um problema do setor da saúde, é um problema social, estrutural e político.
A sobrecarga não afeta apenas os doentes. Também corrói, lentamente, a saúde mental de quem trabalha no sistema. As equipas vivem sob stress permanente, enfrentam decisões difíceis sem o apoio necessário e veem-se obrigadas a compensar lacunas com esforço físico e emocional. A médio prazo, isso resulta em desistência: há quem emigre, quem mude de área ou quem adoeça. E o ciclo repete-se.
A resposta a esta crise não pode continuar a ser paliativa. Aumentar ligeiramente os salários ou prometer contratações pontuais não resolve um problema de fundo. É preciso repensar o modo como valorizamos o trabalho na saúde pública. Isso implica investir na formação de mais profissionais, garantir condições dignas e seguras de trabalho, ouvir quem está no terreno e agir com base nesse diagnóstico.
Também é urgente um planeamento de longo prazo, que tenha em conta o envelhecimento da população, o aumento das doenças crónicas e a pressão constante sobre os serviços de urgência. Continuar a tratar os sintomas sem atacar a raiz da doença só adia o inevitável: um colapso que todos já conseguem antever.
Cuidar dos profissionais de saúde é cuidar do sistema como um todo, porque sem eles, não há cuidados. E sem cuidados, o que resta?
Lícia Alves – Comunidade Lusa
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