
Vivemos num tempo em que o sentido de autoridade parental está de pernas para o ar.
A violência de filhos contra pais é um fenómeno que, durante demasiado tempo, permaneceu silenciado, pela vergonha, pela culpa, pelo medo de destruir laços familiares que se desejavam salvar. Pais que se calam para não perder os filhos e que acabam por perder a paz, a autoridade e o próprio lar.
Por que razão tantos jovens se viram contra aqueles que deveriam ser sempre o seu porto seguro? Para uma geração habituada ao imediatismo, ao “quero, tenho”, o “não” tornou-se sinónimo de rejeição, um ataque pessoal, uma afronta intolerável. Um sinal claro de que falhámos enquanto sociedade: permitimos que os filhos crescessem sem limites, sem frustração, sem referências firmes. E quem nunca aprendeu a lidar com um “não”, dificilmente consegue lidar com a realidade.
Quando os pais recusam conceder tudo, quando estipulam normas ou impõem consequências — justamente porque é isso que os torna pais — muitos jovens respondem não com diálogo, mas com agressão.
Estamos perante uma falha social profunda: pais deixados sozinhos no ato de educar, escolas que não ensinam responsabilidade, uma tecnologia que oferece gratificação instantânea e uma cultura que aboliu limites e consequências.
Até quando aceitaremos que pais se transformem em vítimas dentro das quatro paredes onde sempre deveriam ser protegidos?
A agressão não fere apenas o corpo, mas a própria identidade parental. Gera o medo, instala a culpa: “O que fiz de errado?”, “Será que falhei como mãe/pai?”. O amor, confundido, tenta justificar o injustificável. Muitos destes pais tornam-se prisioneiros do cuidado: emocional, financeiro e físico — para quem mais amam, mas quem mais os agride.
É urgente agir. Criar campanhas de sensibilização e redes de apoio fortes, para que estes pais saibam que pedir ajuda não é desistir do filho, é tentar salvá-lo. Impor limites não é violência, exigir respeito não é autoritarismo. É amor em forma de orientação.
Os pais passam uma vida inteira a cuidar dos filhos. No fim de contas, será assim tão difícil cuidarmos deles quando precisam de nós?
Lícia Alves – Comunidade Lusa

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