O universo da maternidade e do desenvolvimento pessoal já conhece bem o nome de Mikaela Övén, autora e especialista em parentalidade consciente, mindfulness e comunicação empática, conhecida nas redes sociais simplesmente por Mia ou ‘Miafulness’.
No entanto, o seu mais recente trabalho leva-nos a um território muitas vezes silenciado e desconhecido, mas crucial na vida de muitas mulheres: a perimenopausa.
‘A Mãe está a Arder’, editado pela Albatroz, chancela da Porto Editora, é um verdadeiro “manual de sobrevivência”, que aborda com a frontalidade e o humor que lhe são característicos, os desafios, os tabus e a necessidade urgente de informação e acompanhamento sobre esta fase da vida.
Numa altura em que muitas mulheres com mais de 40 anos se sentem sozinhas, esgotadas e veem os seus sintomas desvalorizados, ouvindo que “ainda é cedo” para a menopausa ou que se trata apenas de depressão, Mia sentiu a necessidade de preencher um vazio de informação e quebrar o estigma.
‘A Mãe Está a Arder’ foi influenciado não só pelo seu trabalho de acompanhamento de famílias, onde via um padrão de mulheres “exaustas”, como da sua própria experiência ao encontrar-se no mesmo ‘buraco’ aos 44 anos.
Com esta obra, Mia convida as mulheres (e não só) a olhar para além da “suplementação e hormonas”, que também são importantes. Convida à partilha, à amizade e à celebração, com casos reais, desabafos, exercícios práticos e de meditação. É um “espelho” que diz às mulheres: “Não estás a perder a cabeça. Não estás sozinha. És normal”.
Uma boa leitura para este sábado, 18 de outubro, Dia Mundial da Menopausa.
Acaba de lançar ‘A Mãe esta a Arder’, um livro sobre a perimenopausa. O que a motivou a escrever sobre este tema? Sentiu que havia um vazio de informação sobre o mesmo? Um estigma que precisa ser abolido?
Há uns anos na minha prática de acompanhamentos comecei a ver um padrão muito típico de mulheres com mais de 40 anos. Muito sozinhas, tristes, extremamente cansadas, com diversos sintomas físicos e com uma enorme vontade de serem mães presentes, conscientes, gentis… E estas mulheres continuam a chegar até mim todos os dias. Só que não têm recursos disponíveis para serem a mãe que querem ser. Muitas delas já com tentativas de procurar ajuda médica e psicológica, mas o mais normal é ouvirem que ‘está tudo normal’, que ‘é muito cedo para ser a menopausa’ e que é uma questão de ‘aturar e ter paciência’. São muitas as prescrições de antidepressivos e comprimidos para dormir. Quando aos 44 me encontrei no mesmo buraco comecei a prestar ainda mais atenção. Comecei a consultar especialistas da saúde da mulher e aprendi muito sobre perimenopausa e menopausa. As principais dicas que se dão têm a ver com suplementação, hormonas, exercício e nutrição. Coisas fulcrais! No entanto, percebi que há também algumas outras coisas que fazem toda a diferença e que fazem imensa falta, a amizade, as conversas, a realidade partilhada, a compreensão, a empatia, o humor e a celebração. Foi por isso que escrevi este livro, para nutrir essas necessidades, para as mulheres nesta fase se poderem sentir acompanhadas e para tornar o dia-a-dia mais leve e cheia de risos.
Este ‘manual de sobrevivência’, como descreve, inclui casos reais, desabafos, assim como exercícios práticos e de meditação. Porque que é que é importante dar exemplos verdadeiros às mulheres que passam por esta fase? E porque é que é importante fazê-las refletir?
Teoria sem experiência vivida são só palavras no papel. Quando partilho que me esqueci que os meus pais me vinham visitar, ou quando a minha cliente diz ‘se disser coisas sem sentido é porque dormi três horas interrompidas’, não são anedotas, são espelhos. As mulheres têm sofrido em silêncio há gerações. Quando leem estas histórias reais, percebem: ‘Não estou a perder a cabeça. Não estou sozinha. Sou normal’. E esta experiência de sentirmos que ‘fazemos sentido’, a sensação de sermos compreendidas e que existe uma realidade partilhada, é fundamental para o nosso bem-estar. Dá-nos força para continuar, para encontrar novos caminhos e para realmente cuidarmos de nós.
E quais são as verdades que as mulheres vão encontrar neste livro que “ninguém lhes contou”?
Algo que procuro muito reforçar no livro é o facto de que podemos olhar para esta fase como um início e não um fim. Podemos celebrar em vez de estar de luto. Fala-se muito das coisas más e difíceis, mas pouco da liberdade que pode vir com esta fase de vida e um olhar e pensamentos diferentes mudam a nossa experiência.
Qual ou maior mito ou tabu que espera desmistificar com este livro?
Penso que um dos piores mitos é que esta fase só começa lá para os 50. Ainda hoje recebi uma mensagem no Instagram de uma mulher desesperada que dizia: ‘O meu médico de família desvaloriza, a minha ginecologista a mesma coisa. Dizem que devo ter depressão, mas sabe, Mia, eu sei que são flutuações hormonais. Eu sei, mas ninguém me ouve’. Há tantas mulheres que ouvem que ‘ainda é cedo’ e cujos sintomas estão a ser ignorados e menorizados. Ou que são despachados com ansiolíticos ou antidepressivos. Este mito faz com que as mulheres não procurem ajuda especializada, que normalizem o sofrimento, e pior, que se sintam culpadas por não conseguirem aguentar. É como se fôssemos programadas para sofrer em silêncio.
Apesar deste ser o tema bastante sério, aborda-o com humor. Isso ajuda a manter o ânimo e a ultrapassar os desafios desta fase?
Eu acredito plenamente que sim! O humor não é só estratégia de sobrevivência – é mesmo sobrevivência! O que mais me tem safado são os momentos com amigas na mesma fase de vida onde juntas nos estamos a rir do que se está a passar. Têm sido tantas as gargalhadas a partilhar histórias umas com as outras. A partilha de memes e reels divertidos que nos conectam à distância. Às vezes parece que precisamos de permissão para rir de nós e dos nossos desafios. Rir pode mesmo ser terapêutico. E há tantas razões para rir!
Aborda também a necessidade de se sentir “acompanhada” e “compreendida”. De que forma é que podemos promover isso? Que passo é que a sociedade devia dar nesse sentido?
Primeiro, os profissionais de saúde precisam de levar as mulheres a sério, é necessário mais conhecimento sobre a (peri)menopausa, mas também sobre empatia e como oferecer um espaço onde as mulheres se possam sentir acompanhadas e compreendidas. Além disso, muitas mães portuguesas gerem pais idosos, educam filhos, lidam com carreiras (e parceiros) enquanto os corpos passam por grandes mudanças. Precisamos de bons apoios à família que os familiares percebam que quando a mãe precisa de silêncio, não é luxo – é necessidade. No fundo, ligando à minha principal atividade, isto começa na forma como exercemos à nossa parentalidade. Com uma parentalidade consciente desde o início conseguimos mais facilmente garantir que haja esse apoio e acompanhamento ao longo da vida, para todos.
De que forma é que os seus anteriores livros, sobre parentalidade consciente, mindfulness e comunicação empática se aplicam nesta obra?
No ‘Heartfulness’ escrevi sobre viver de coração aberto e este livro no fundo é a continuação prática. Quando estás na perimenopausa a educar filhos, precisas de ferramentas além da teoria. Uso Comunicação Não-Violenta para ajudar mães a ganharem mais clareza e a expressar necessidades e pedidos sem explodir. Há quem diga que a qualidade da nossa vida é determinada pela qualidade das nossas relações e nesta fase muitas relações sofrem, porque a mulher sofre. Como a parentalidade consciente é sobre criar relações saudáveis tudo que propõe é muito útil nesta fase.
De que forma é que a prática de mindfulness transforma a dinâmica familiar e o bem-estar das mães/mulheres?
Mindfulness não é sobre tornarmo-nos zen, é sobre tornarmo-nos reais. Ajuda-nos a enfrentar o dia e os desafios ‘mindfulmente’, reguladas, com clareza e com foco no que realmente interessa. Ou seja, não é tanto sobre praticar meditação, mas sobre estar plenamente presente. Essa presença promove conexão, compreensão, segurança e tranquilidade na dinâmica familiar o que por sua vez resulta em mais colaboração e menos momentos de confusão. No livro falo de algumas ferramentas que podemos usar como por exemplo os ‘check-ins emocionais’ e também há propostas de meditações que podemos fazer para ajudar neste caminho.
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