O espetáculo intitula-se “chãocéu| (Micropeça #2″)”, e, depois de ter passado por Leiria, Lagos e Barcelona, desde 2024, estreia em Lisboa, criada e interpretada pelos artistas Vera Mantero, Henrique Furtado Vieira e João Bento.
Na origem desta peça está “O Susto é um Mundo” (2021), na qual a coreógrafa Vera Mantero “deixou vários materiais por explorar”, e aos quais quis “dar continuidade”, explicou o ator Henrique Furtado Vieira em entrevista à agência Lusa.
“Muitas vezes, na nossa área, há um processo de criação muito longo, o espetáculo estreia e apresenta-se em palco durante alguns dias, circula, se tudo correr bem, e depois acaba. A Vera [Mantero] quis prolongar a pesquisa, e a criação de micropeças foi a forma que encontrou para salvaguardar essa continuidade”, contextualizou Furtado Vieira.
Em 2023, a coreógrafa iniciou a criação de “micropeças” a partir desses materiais de “O Mundo é um Susto” não desenvolvidos, em colaboração com alguns artistas do projeto original.
A primeira, “Um Pequeno Exercício de Composição”, contou com Teresa Silva e Santiago Tricot, e centrava-se num anel metálico duplicado.
Em “chãocéu” continua essa exploração de conceitos, usando, entre outros, textos de “Excertos de Morte e Democracia”, obra do filósofo José Gil, editada pela Relógio d’Água (2023).
“Esta peça tem dois símbolos – a linha horizontal e a vertical – somos três pessoas em palco, e há mais três elementos protagonistas que são três escadotes iguais, do mesmo formato, que na peça de origem eram um elemento periférico”, descreveu Henrique Furtado Vieira.
Ali, os intérpretes, despidos, elevam-se, desafiando a gravidade e o olhar do público, como se tentassem segurar o céu em queda, e vão desfilando criaturas míticas que habitam o universo, fundindo corpo e objeto, som e movimento.
Henrique Furtado Vieira disse ainda que este espetáculo faz a ligação, “simbolicamente, poeticamente e metaforicamente, entre o chão e o céu, explorando esta oposição”, originária de imagens da peça original focadas na cultura hindu, “de pessoas a tentar tocar nos pés dos deuses subindo escadotes”.
Foi esta dicotomia do céu e do chão que os três autores quiseram desmontar: “Um conceito muito importante para nós é a junção de opostos. Nos trabalhos de Vera Mantero há uma tentativa de fazer um ´cheque-mate´ aos opostos, e aqui tentou-se fazer isso à ideia de que os Deuses estariam no céu, os humanos no chão, e que a espiritualidade seria algo inatingível e inacessível”.
“Nesta peça, sublinhamos que a ideia da espiritualidade é imanente e também está no chão, próxima, ao nosso alcance”, vincou o performer, acrescentando que o conceito “é tratado de forma poética e metafórica, e muito figurativa, com imagens de Deuses, personagens reconhecidas do desporto e da política, outras da mitologia, como gárgulas e guerreiros, e, nesse sentido, tem uma dimensão muito visual e sonora”.
A peça, em palco de quarta-feira a domingo, tem desenho de Luz em cocriação de Hugo Coelho e Miguel Cruz, com som de João Bento, numa produção da estrutura artística O Rumo do Fumo em coprodução com o Teatro José Lúcio da Silva, de Leiria, e La Caldera — Barcelona, Espanha.
Henrique Furtado Vieira fez formação artística em França, nomeadamente no Instituto Nacional de Ciências Aplicadas, em Lyon, e no Centre de Développement Chorégraphiqueo Extensions de Toulouse, desenvolvendo a sua prática artística principalmente entre a criação coreográfica.
João Bento, licenciado em Artes Plásticas pela Escola Superior de Artes e Design, desde 2004 compõe som para performances, dança, filmes experimentais, peças de teatro e ´live acts´, num trabalho que articula instrumentos analógicos e objetos sonoros usados num contexto multidisciplinar.
Vera Mantero estudou dança clássica com Anna Mascolo e integrou o Ballet Gulbenkian entre 1984 e 1989, tornando-se um dos nomes centrais da Nova Dança Portuguesa, depois de iniciar a carreira coreográfica em 1987, e mostrado o seu trabalho por toda a Europa, Argentina, Uruguai, Brasil, Chile, Canadá, Coreia do Sul, EUA e Singapura.
Fonte : Notícias ao Minuto
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