
A Associação Portuguesa de Mulheres Juristas (APMJ) endereçou, esta segunda-feira, uma carta ao diretor nacional da Polícia Judiciária (PJ), Luís Neves, manifestando “repúdio e preocupação” por uma publicação nas redes sociais sobre um abuso sexual.
Em causa está uma publicação na rede social Facebook, na qual a PJ partilhou, na passada quinta-feira, que deteve “um homem por crime de abuso sexual que vitimou uma jovem de 17 anos” e explicou que o “crime ocorreu em Lisboa, na sequência de uma saída noturna, na qual a vítima acabou em estado de inconsciência após consumo excessivo de álcool”.
Nessa publicação, a autoridade diz que “a incapacidade de reação” devido ao consumo de álcool “ditou mais uma vítima” e deixou várias recomendações, nomeadamente “moderar o consumo de álcool”, “não aceitar e vigiar as bebidas” e “recusar boleia de desconhecidos”.
Na carta endereçada ao diretor nacional da PJ e enviada às redações, a APMJ manifestou o seu “repúdio e preocupação pela forma” como a nota informativa foi redigida, porque “da sua leitura resulta que a conduta do agressor foi espoletada pelo comportamento da vítima, como se esta tivesse sido a responsável pela agressão que sofreu e, ainda, como se o crime tivesse ocorrido apenas em virtude de aquela não ter oferecido resistência”.
A associação alerta que a “verificação de tal circunstância não impede que, do ponto de vista legal, se verifique a prática de um crime sexual” e, por isso, a PJ “não o deveria indicar da forma como o faz”.
“A Associação Portuguesa de Mulheres Juristas frisa, ainda, que neste tipo de criminalidade especialmente violenta não apenas não pode, nem deve, ser estabelecida aquela relação de causalidade entre o comportamento da vítima e a agressão sexual porque a sua consequência lógica se apresenta como justificativa e desculpabilizante da conduta criminosa, como também, e simultaneamente, tal contribui para um reforço dos sentimentos de insegurança, medo e vergonha da vítima, reforçando e amplificando todos os estereótipos e preconceitos atinentes aos crimes sexuais”, lê-se na carta.
A APMJ lamenta, ainda, que a publicação seja “totalmente omissa na indicação de qualquer meio de informação e apoio às vítimas de agressões sexuais, ou de recursos públicos e serviços especializados disponíveis em tais casos, que possam habilitar quaisquer eventuais futuras vítimas a lidar com situações idênticas à aí descrita”.
Movimento Democrático de Mulheres diz que publicação “promove uma inaceitável responsabilização das mulheres”
Além do alerta da APMJ, foi também apresentada, esta segunda-feira uma queixa à Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género pelo Movimento Democrático de Mulheres.
Para o movimento, citado pelo Jornal de Notícias, “o texto e a imagem escolhidos deslocam o foco do crime para uma imagem de mulher, insinuando um nexo causal entre ser mulher, sair à noite, consumir álcool e ‘maus desfechos'”.
“Esta narrativa não informa nem previne: estigmatiza de forma inaceitável. Ao estigmatizar, promove uma inaceitável responsabilização das mulheres e desculpabiliza os agressores por práticas criminosas”, denuncia.
Adolescente de 17 anos foi abusada sexualmente por segurança de discoteca
Em comunicado, enviado na passada quarta-feira, 29 de outubro, às redações a PJ indicou que deteve “um homem de 36 anos, por crime de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência, na forma agravada, sendo vítima uma jovem de 17 anos de idade, em Lisboa”.
O crime ocorreu em agosto de 2025, “num estabelecimento hoteleiro” e o suspeito “é segurança num estabelecimento de diversão noturna que a vítima frequentou com um grupo de amigas”.
Nessa madrugada, a jovem ficou alcoolizada e o suspeito, que já tem antecedentes criminais por crimes da mesma natureza, disponibilizou a sua viatura para que pudesse “recuperar do estado de incapacidade em que se encontrava”. No entanto, aproveitou-se do facto de a menor estar inconsciente e “conduziu-a até um estabelecimento hoteleiro onde viria a consumar o abuso sexual”.
O crime foi denunciado à Polícia de Segurança Pública (PSP), que passou o caso para a PJ.

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