Habitação. Em vez de bala de prata, pólvora seca

António Capinha

No ano de 1995 construíram-se em Portugal 68 825 novos fogos de diferentes tipologias, desde T0 a T4, destinados, exclusivamente, a habitação familiar.

Em 2022 edificaram-se, apenas, 20 156 novas habitações destinadas ao mercado da habitação familiar.

Este é, pois, o problema número um da habitação em Portugal. Um mercado que ao longo dos anos colapsou, onde a escassez de oferta fez aumentar o preço do bem, perante uma procura cada vez mais avassaladora.

Desde o primeiro momento em que começou a fazer a Lei da Habitação (Pacote Mais Habitação) que o governo sabia do estado do mercado habitacional. E tinha consciência, igualmente, que era preciso coragem política para elaborar uma lei que devolvesse a oferta de habitação aos portugueses. Estava em causa a construção de um novo e ambicioso edifício legislativo que fosse eficaz na dinamização do mercado da construção, e criasse as condições para fazer renascer essa​​​​​ ​​componente da economia, na sua vertente privada e social.

Claro que isto não era um projecto que se traduzisse em resultados imediatos. Era necessário intervir na política de solos, dedicar terrenos para a construção de habitação social através de cooperativas, criar as condições financeiras e fiscais para os empresários da construção civil colocarem as suas empresas (hoje quase todas falidas) de novo em funcionamento.

Dar, também, boas condições de financiamento aos cidadãos, sobretudo aos jovens, para a aquisição de habitação própria.

Criar, ainda, um conjunto de eficazes incentivos fiscais, para quem quisesse adquirir casa própria, sobretudo os mais jovens e os carenciados. Tudo isto é claro, demora tempo.

Deste modo a construção de uma lei que preenchesse os requisitos atrás citados só seria possível com um governo que pensasse o país a dez, quinze, vinte anos. Visão de futuro, portanto! Tratava-se de encontrar a tal bala de prata que a ministra da Habitação diz que não existe para solucionar a falta de casas em Portugal.

Mas, na sua já habitual estratégia imediatista, o Executivo decidiu construir uma Lei da Habitação que nada resolve. Um fogacho! Com esta Lei não haverá mais casas novas no mercado. Com esta legislação os jovens não conseguirão, nem alugar, nem comprar casa.

Em que se traduziu, então, a acção do Executivo? Numa lógica de “é preciso fazer alguma coisa para que tudo fique na mesma”, procurou saber onde havia casas que, eventualmente, pudessem vir a estar disponíveis. E, com oportunismo político, quer ir buscá-las ao alojamento local e ao arrendamento coercivo

Não importa ao governo que, com esta sua opção, coloque em risco um sector da actividade económica tão importante, como o Alojamento Local, onde muitas famílias procuraram um suplemento financeiro para o seu depauperado orçamento familiar. Não interessa ao Executivo pôr, quase, uma lápide sobre um sector que foi responsável pela reconstrução de inúmeras habitações que há décadas se encontravam degradadas. Quem investiu nessa componente da economia portuguesa, vital para o crescimento do turismo, que se lixe.

Claro que o Presidente da República tem razão quando diz que o número de casas no mercado não vai subir nos próximos anos. Mesmo as poucas casas que o governo possa conseguir com esta nova legislação, seja no aluguer compulsivo ou no universo do alojamento local, serão sempre insuficientes para suprir as necessidades que o país tem de novas habitações.

Com esta lei o governo de António Costa não interveio na componente da iniciativa privada, nem pôs o Estado a criar um parque habitacional que servisse de solução para os que mais necessitam de encontrar casa.

Em vez disso, a ministra Marina Gonçalves optou por uma legislação que em nada vai resolver a falta de casas que, diariamente, os portugueses experienciam.

Não tendo bala de prata, a ministra resolveu usar pólvora seca. Que, como se sabe, faz muito barulho, mas não serve para nada. De São Bento saiu uma lei para coisa nenhuma.

António Capinha

Jornalista

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