Não estava em Portugal para poder ver em direto televisivo a super-mega operação do Ministério Público e da Polícia Judiciária no “assalto” à casa do ex-líder do PSD, Rui Rio. Todo o aparato descrito em notícias que fui lendo, os imensos locais de busca e as intermináveis horas de trabalho para confirmar que o PSD fez, entre 2018 e 2021, o que já fazia antes dessa data e continua a fazer em data presente, parece ser altamente desproporcional para o que está em causa. Acresce que a probabilidade não haver crime nenhum é muito alta e a prática é comum a outro partidos. Se, além disso, uma estação de televisão foi previamente avisada, o que pretendia o Ministério Público? Seguramente, não quis fazer justiça naquele dia, porque o único flagrante a que assistimos foi a violação de vários direitos de Rui Rio.
As perguntas que o ex-líder do PSD fez a Lucília Gago, Procuradora-Geral da República, são muito pertinentes e mereciam resposta. Porque é que só está a ser investigado o PSD e só no período em que Rio foi líder? Não podemos excluir tratar-se de uma pequena revanche pelas propostas que o ex-líder do PSD sempre fez para melhorar a Justiça porque elas iam no sentido de diminuir o poder discricionário do MP e, sobretudo, de responsabilizar os seus dirigentes pelas decisões que tomam. Num país em que tantos dizem “à política o que é da política, à justiça o que é da justiça”, mas onde é igualmente comum a judicialização da política e a politização da justiça, também não se deve descartar a hipótese de ser uma cortina de fumo para esconder incompetências noutras investigações ou casos concretos noutra área política. Pode ser apenas uma coincidência, mas soa a adaptação de uma velha máxima que pode ter o perigo de ser olhada como “quem se mete com o MP leva”. Se o receio de afrontar os poderes instalados na justiça já existia, nada dizer sobre esta operação aumenta o risco de criar em Portugal um sistema de mãos livres para que o MP faça o que quiser.
O país que não serve para se “apresentar em lado nenhum”, nas palavras de Rio manifestando o seu desagrado pela operação do Ministério Público, ficou de repente preocupado com a possibilidade do ex-líder do PSD ter a ambição de um regresso à política ativa. Ironicamente, pode dizer-se que se a justiça tivesse atuado mais cedo ainda dava tempo para ter posto Rui Rio na sondagem das presidenciais de 2026, feita pela Intercampus para a CMTV, tornando-a mais interessante. Rio diz que não, que está farto. Mas, na política, o que hoje é mentira amanhã pode ser verdade. “Persona non grata” nos media e entre os comentadores, o ex-líder do PSD é um alvo fácil e só isso explica que tenha havido tanta gente a querer levar a sério o banho de ética que o Ministério Público quis dar a Rui Rio.
Da Justiça temos de dizer que aqueles que estão sempre a queixar-se de falta de meios, para justificar os atrasos nas investigações ou as incongruências entre as “sentenças” dos julgamentos na praça pública e a incapacidade de levar sequer a julgamento nos tribunais, colocaram mais de uma centena de pessoas nesta operação como se estivessem quase-quase a apanhar o criminoso n.º 1. Na semana em que o Parlamento debate o estado da Nação, não seria mau que que os partidos assumissem a prioridade de dar ao país a Justiça de que ele está absolutamente necessitado. Não a que faz julgamentos sumários num conluio entre o jornalismo justiceiro e procuradores incompetentes ou vingativo. A que sabe quais são as prioridades, que investiga sem olhar a quem, que produz prova para apresentar em tribunal dando ao juiz a possibilidade de condenar com pena justa. Se os alvos a abater forem apenas os que dizem que “o rei vai nu” não haverá muito trabalho para fazer, porque a maioria dos políticos tem medo. Porque será?
Paulo Baldaia
Jornalista
