• Abril 20, 2025
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Para além da NATO, criar uma coligação de apoio à legítima defesa da Ucrânia

Estamos nas vésperas da cimeira da NATO deste ano, que terá lugar a 11 e 12 de julho, em Vílnius, a dois passos de Kaliningrado, o exclave russo altamente militarizado, encravado no seio de países da Aliança Atlântica. Kaliningrado é uma demonstração de que é possível construir um relacionamento pacífico com a Rússia, mesmo numa geografia particularmente complexa: basta que se respeitem as regras estabelecidas depois do fim da União Soviética e as normas internacionais que regem a relação entre países vizinhos.

Voltando à cimeira, há quem pense que Vladimir Putin poderá fazer acontecer algo que distraia as atenções e secundarize a importância do encontro. Ou mesmo, que altere completamente a sua agenda. Uma hipótese poderia ser Zaporíjia, a central nuclear ucraniana situada numa das zonas ocupadas pelos invasores. Mais concretamente, os russos poderiam provocar um número reduzido de explosões controladas, no interior da central, ou na cobertura exterior dos reatores, e acusar as tropas ucranianas de haverem disparado contra os edifícios. Atos desse género criariam um certo nível de confusão e teriam como objetivo prejudicar a imagem ucraniana.

Esperemos que tal não aconteça, embora veja uma hipótese muito alta de uma possível sabotagem russa. No ponto da situação n.º 171, publicado esta quarta-feira, o diretor-geral da Agência Internacional da Energia Atómica, Rafael Grossi, pede formalmente aos ocupantes russos que permitam o acesso a certas áreas da central, que continuam interditas, para que os peritos da Agência possam confirmar se existem, ou não, minas e outros explosivos nesses locais. Trata-se de salas onde se encontram partes das turbinas e do sistema de refrigeração. Também solicita, com a mesma firmeza oficial, autorização para inspecionar as coberturas dos reatores 3 e 4 e outras áreas mais sensíveis. No essencial, está a dizer-nos que os russos não consentem que se faça uma verificação completa da central. É uma verdade preocupante.

A Ucrânia será um tema central em Vílnius. Deveria ser formalmente convidada para membro da Aliança, com um plano de ação claro que levasse rapidamente à sua adesão.

É um facto que as normas existentes não deixam entrar para a organização um país que está em guerra. Isso traria o conflito para o interior da NATO. Mas, tratando-se de uma agressão perpetrada por um país fora-da-lei internacional, como é a Rússia de Putin, é preciso adotar regras mais flexíveis. A Ucrânia, por muita assistência logística que receba do Ocidente, não pode continuar a combater a invasão russa de modo isolado. Acreditar que os países da Aliança irão continuar a apoiar a Ucrânia o tempo que for necessário pode ser uma ilusão. Não tem em conta os limites orçamentais e logísticos, nem as oscilações possíveis na opinião pública. A contraofensiva ucraniana exige tempo e meios excecionais. Temos aqui duas fragilidades enormes. Os russos saberão explorar esses limites e manipular a opinião ocidental, com a ajuda dos comunistas, dos seus compadres da extrema-direita e outros idiotas úteis.

Os invasores têm de ser expulsos sem demoras. Depois, poder-se-á falar da construção de um novo sistema de paz na Europa. E negociar com quem estiver no Kremlin.

A manobra russa é prolongar a crise o tempo que for necessário. Dmitri Medvedev, que era considerado um frouxo, quando estava na Presidência, a manter quente a cadeira de Putin, escreveu esta semana no jornal do regime, Rossiyskaya Gazeta, que a Rússia está preparada para um conflito que possa durar décadas. Disse ainda que a confrontação nuclear com o Ocidente é muito provável. Penso que Medvedev traduz agora uma corrente de opinião que tem algum peso no Kremlin.

A cimeira cometeria um erro gravíssimo se ignorasse uma opinião dessas. Será normal não aceitar a adesão da Ucrânia de imediato. Mas a hipótese de uma coligação de Estados, pertencentes a várias geografias, a quem a Ucrânia poderá pedir ajuda para se defender não é impensável. É uma possibilidade que está dentro dos poderes soberanos da Ucrânia. Esses Estados iriam apoiar, em território ucraniano, a legítima defesa do país. Não estariam em conflito contra a Rússia, mas apenas acudir a quem partilha os mesmos valores e está a ser agredido.

Iria isto provocar uma guerra alargada a outros países? Penso que não: Putin não dá sinais de querer entrar numa confrontação direta com a NATO.

 

 

Victor Ângelo

Conselheiro em Segurança Internacional.
Ex-secretário-geral-adjunto da ONU

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