Na última semana, Castro Daire, uma vila do distrito de Viseu, viveu uma tragédia que abalou toda a região: dois jovens colocar fim à vida e outros tentaram fazê-lo, num espaço de tempo curto demais para ser ignorado.
O suicídio entre jovens é um tema difícil, quase tabu. Preferimos acreditar que “essas coisas” acontecem noutros lugares, a outras pessoas. A verdade é que, por trás de cada história, há sinais que não foram compreendidos, palavras que ficaram por dizer e uma solidão que cresceu em silêncio. Quando uma comunidade pequena é atingida desta forma, todos somos chamados a olhar de frente para o que não queremos ver: o sofrimento dos nossos jovens.
Fala-se muito de sucesso, de notas, de desempenho, de futuro. No entanto, fala-se pouco de ansiedade, medo, comparação e exaustão. As redes sociais alimentam a ilusão de que todos estão bem, que a vida é bonita, perfeita e cheia de conquistas e quem se sente “fora do padrão” acredita que o problema é dele, que não pertence, que falhou. É aí que o isolamento cresce e é nesse silêncio que muitos gritam, sem que ninguém ouça.
As escolas fazem o que podem, mas quase sempre com recursos insuficientes. Em muitas, há apenas um psicólogo para centenas de alunos. O tempo para ouvir, compreender e acompanhar é curto. O problema, porém, não se resolve apenas com mais técnicos — é necessária uma cultura e um pensamento diferentes. Precisamos de escolas que falem de emoções com a mesma naturalidade com que falam de matemática. De professores preparados para reconhecer sinais. De pais e encarregados de educação que se sintam à vontade para perguntar “estás bem?” e ouvir, de verdade, a resposta.
Castro Daire não é um caso isolado. É o espelho de muitas localidades onde a proximidade é grande, mas o diálogo é pequeno, onde todos se conhecem, mas poucos realmente se ouvem. O sofrimento psicológico não é fraqueza, nem moda. É uma condição humana que exige empatia, compreensão e ação e, quando ignoramos isso, deixamos que o desespero ocupe o lugar da esperança.
Precisamos de quebrar o ciclo do silêncio. De ensinar que pedir ajuda é um ato de coragem, não de vergonha. De criar espaços — na escola, na família, na comunidade — onde se possa falar sobre o que dói, sem medo de julgamentos.
A tragédia em Castro Daire é um alerta doloroso, mas pode ser também um ponto de viragem. Que não se fale apenas dos que partiram, mas também dos que ficaram e que precisam, mais do que nunca, de saber que não estão sozinhos.
Se este tema chegar a mais alguém, que sirva para abrir uma conversa. Às vezes, salvar uma vida começa com uma pergunta simples: “Queres falar comigo?”
Lícia Alves – Comunidade Lusa
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