• Abril 19, 2025
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A crise portuguesa e o alargamento

Na passada semana, trouxe algumas questões com impactos vários no futuro próximo do concerto europeu e, necessariamente, na posição de Portugal em defesa dos seus interesses. Levantei a vantagem de um alargamento do mercado interno, de novas oportunidades para o investimento e para a mobilidade laboral. Vantagem acompanhada por um novo valor agregado na competição global por matérias-primas críticas à transição energética e tecnológica, pelas novas geografias acolhidas, também elas com infraestruturas estratégicas e acesso a rotas comerciais relevantes. Apontei para os efeitos, sobretudo da adesão da Ucrânia, na reafetação de recursos orçamentais na agricultura e na coesão, obrigando a ajustamentos que afetarão Portugal, o que implica sermos capazes de executar, dentro dos calendários e com impacto na vida das pessoas, as verbas que o PRR e o PT2030 disponibilizam. Referi, ainda, os impactos que um ambiente bipolar sino-americano, assente numa acesa competição por recursos, poder e influência, tem no espaço de manobra tradicional de Portugal, enquanto plataforma internacional entre Estados, organizações e continentes, o que nos deve levar a fórmulas diplomáticas criativas para preservarmos os nossos interesses e valores, acompanhando os novos eixos estratégicos na Europa e as dinâmicas aceleradas no sistema internacional e na globalização económica. Por fim, deixei o alerta de acomodarmos o alargamento a países ocupados por tropas russas a uma cláusula de defesa mútua da UE que não se assemelha à dissuasão proporcionada pelo artigo 5º da NATO, o que pode ser aproveitado por Moscovo num contexto em que uma administração Trump se desligue da segurança europeia e onde não asseguremos uma coordenação forte com o Reino Unido.

Hoje, deixem-me trazer mais duas ou três questões que o alargamento também levanta, até porque a Comissão Europeia se pronunciou sobre os vários estatutos dos países em causa, tema principal do próximo Conselho Europeu em dezembro. Um deles fica visível pela distinção entre os patamares em que cada um se encontra, sendo que a Ucrânia e a Moldova avançaram mais no último ano do que alguns dos Balcãs numa década. A dúvida é: será o alargamento feito em bloco, esperando uns pelos outros, ou avançará quando tiver de ser em função dos critérios preenchidos (objetivos, políticos e estratégicos), abrindo feridas nas expectativas, defraudando esforços, alimentando possíveis clivagens aproveitadas por terceiros? Como lidará Portugal com esse processo, para evitar expor uma eventual nova frente de grande tensão na coesão europeia?

Outra questão diz respeito às eventuais transformações na orgânica e funcionamento das instituições, desde um roteiro para novas receitas financeiras, para suprir perdas líquidas face aos parâmetros atuais de distribuição, até à tipologia dos comissários (em rotação?, com graus distintos?), passando pela fórmula de cálculo dos mandatos ao Parlamento Europeu, e terminando numa alteração da votação por unanimidade para maioria qualificada, em matérias que digam respeito, por exemplo, à política externa e de segurança ou até ao reforço da condicionalidade orçamental pelo estrito respeito do Estado de Direito. Como nos posicionamos sobre isto? Que consensos nacionais conseguiremos gerar, num quadro de eventual fragmentação política pós-eleitoral, sem uma solução sólida de governo indisputável no seu compromisso europeu e atlantista, as duas faces de uma mesma estratégia que consolidou democraticamente Portugal ao longo das últimas cinco décadas?

Qualquer destes pontos acarreta um debate sério entre os partidos portugueses, sobretudo os dois grandes. A identificação dos riscos e oportunidades do alargamento também implica um acompanhamento dos debates em curso, alguns deles feitos por entidades não oficiais com influência em processos de decisão. E as posições dos partidos, dos candidatos a líderes e as próprias soluções governativas depois de 10 de março seriam mais sérias se também tivessem em conta que o seu futuro político se cruzará, mais cedo ou mais tarde, com as transformações geradas pela guerra, pelo alargamento, pela autonomia estratégica europeia e pelos alinhamentos externos que soubermos preservar.

Pelo meio, Putin não vai sair de cena e é possível que Trump regresse. Precisamos mesmo de falar seriamente sobre tudo isto.

 

Norte

O regresso de David Cameron ao governo britânico é a surpresa da semana, num país que vai no sétimo ministro dos Negócios Estrangeiros e no quinto primeiro-ministro em sete anos, desde o referendo do Brexit. Não há milagres.

Sul

A construção de uma quinta base científica da China na Antártida mostra como também o Polo Sul está no radar estratégico de Pequim: mapeamento por satélite de oportunidades marítimas e de vulnerabilidades de terceiros.

Este

Outra surpresa política veio do Syriza, partido de esquerda radical que emergiu no epicentro da crise financeira grega e que elegeu um ex-Goldman Sachs para seu líder. Do choque às cisões internas, tem sido um pequeno passo.

Oeste

As recentes vitórias democratas em eleições e referendos na Virgínia e no Ohio mostram que o eleitorado feminino vai ser fundamental para Biden vencer em 2024, o que implicará valorizar, também por isso, Kamala Harris até lá.

 

 

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